domingo, 23 de janeiro de 2011

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Colonia del Sacramento, Uruguai, 02 de janeiro de 2011

Difícil foi “dar dedo” a primeira vez.

Agora, na carroceria dessa pick-up eu estou confiante que vamos conseguir chegar em Montevidéu pegando carona. Eu estou muito emocionado. O Nego e o Leo também. O Leo acabou de pegar sua guitarra e está cantando com o Nego. Talvez a gente possa conhecer muitos lugares assim, “de graça”, se tudo der certo.

- Che, que foda! Eu sempre quis fazer isso! – falo.

- Eu também! – diz o Nego.

- Eu também! – diz o Leo.

A distância entre Colonia e Montevidéu é de 170 quilômetros. Esse casal pode nos levar por 20 quilômetros, apenas. Depois teremos que seguir pedindo carona. Como conseguimos essa em menos de 20 minutos “dando dedo”, penso que antes do fim do dia (agora são, talvez, duas da tarde) estaremos em Montevidéu.

Fico observando a paisagem em movimento. O dia está ensolarado, com algumas poucas nuvens branquinhas deslizando pelo céu. A estrada corta campos planos e bem verdinhos, como aqueles que se pode ver viajando pelo interior de São Paulo, ou mesmo pelo interior da Inglaterra. O mundo parece muito igual às vezes.

O carro encosta e a senhora nos avisa que devemos descer ali. Começamos a tirar as mochilas e os violões do carro às pressas, para não atrasar a viagem do casal.

- Che, dá um desses panetones pro casal – falo.

- Tem certeza?

- Sim! Como agradecimento!

O Nego entrega o panetone para a senhora, que nos oferece uma garrafa de cerveja. Aceitamos. Ela nos diz para pega-la na caixa térmica que está na carroceria. Como o Leo não encontra, ela desce para pegar. Aproveita e nos dá uma garrafa de Pepsi também.

- Para amenizar a viagem de vocês! – ela diz.

É impressionante como, ao pensar em cair no mundo desse jeito, a gente quase sempre pensa o pior; que vamos encontrar pessoas más pelo caminho, que vamos ser assaltados e mesmo correr risco de morte. Ou nós três temos muita sorte, ou existem tantas pessoas boas quanto pessoas más no mundo.

- Muchas gracias! – agradecemos antes do casal seguir viagem.

***

Agora sim, eu digo que essas mochilas estão pesadas pra caralho. Depois de uma hora – acho – dando dedo e sem conseguir nenhuma carona, nós começamos a caminhar na beira da estrada com esperança de chegar a algum posto de gasolina e tentar a sorte aí, onde os carros parados sejam mais fáceis de abordar.

O sol ficou mais forte, a bagagem mais incômoda, a boca mais seca. Olhando pra frente, vejo a estrada seguir (ladeada por campos) até tocar o céu, no horizonte. Olhando para traz, idem. Meu humor, por incrível que pareça, ainda está bom. Encarar isso como uma brincadeira ajuda a relaxar.

- Hey! Aquilo é uma miragem? Estou louco já, ou tem um grupo de garotas sentadas na beira da estrada, do lado de lá? – pergunto.

- Sim, me parecem garotas – responde o Leo.

Seguimos caminhando e, quando passamos alguns metros do local onde estão sentadas as garotas, o Leo decide parar e puxar assunto com elas. Nunca é mal tentar descolar companhia.

- Certo, então abre essa cerveja pra mim, deixa as mochilas aqui e vai lá com o Emerson. Convida elas para tomar uma Pepsi!

- Che, você não vai com a gente?

Respondo mostrando o anel de compromisso em meu dedo anelar da mão direita. Ele entende o recado, puxa o Nego e, juntos, vão em direção as moças.

Talvez por estar morto de sede – um talvez com 90% de chances de acerto – eu bebo a cerveja como nunca antes. O sabor está perfeito, suave, sem amargar muito. Essa “Pilsen” uruguaia nem se compara à famosa (e mais barata) “Quilmes” argentina.

Após um breve instante, Nego e Leo regressam. Sozinhos.

- Nossa, todas elas são muito lindas! – fala o Nego.

- Isso eu notei daqui! – respondo. E aí, o que elas estão fazendo aí na beira da estrada, desse jeito?

- Elas nos falaram que estão esperando um ônibus para Colonia. – responde o Leo.

- Sério? Que coisa! Capaz que seja uma armadilha. Estão aí para chamar a atenção de um bando de manés como a gente e nos roubar tudo ahahahaha! – digo.

- Hahahaha. Capaz! Mas elas me pareceram muito legais!

- Isso porque não podem roubar nada da gente, que não tem nada! Hahahaha! E não quiseram tomar a Pepsi?

- Não...

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