domingo, 9 de janeiro de 2011

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Buenos Aires, 16 de dezembro de 2010

Eu já vi muitas coisas. Sim, posso dizer sem nenhum exagero que já vi de tudo, desde que fui criada e colocada aqui no céu, solitária, com todas essas estrelas e planetas ao redor.

Mesmo tendo visto tantas coisas, mesmo sendo tão experimentada, agora eu fico emocionada. Agora, eu estou testemunhando a coisa mais bela que os seres humanos são capazes de fazer: amar.

Pela janela aberta do apartamento eu posso observar tudo o que se passa. Meus raios de luz adentram a sala escura timidamente, o suficiente para dar um leve toque romântico à cena.

Eu sou assim mesmo, uma romântica incorrigível – talvez por isso os apaixonados sempre recorram a mim quando estão longe da pessoa amada. Às vezes me pedem para enviar mensagens, às vezes me pedem para mandar beijos e/ou abraços e, às vezes, limitam-se a me olhar buscando o rosto de sua outra metade.

Agora, porém, eu sou mera expectadora dos acontecimentos. As duas partes formam, nesse momento, o todo, em sua última noite juntos – mesmo que não saibam disso, ou que não queiram acreditar. Às vezes é triste conhecer presente, passado e futuro.

A sala do apartamento antigo onde moram não é muito grande, mede aproximadamente três por cinco metros, com pé direito de quase cinco metros. Mas, assim à meia-luz, parece um pouco maior.

Os móveis são antigos. Da janela da sala, de onde observo a cena, posso ver na parede norte uma estante onde fica o televisor; na parede leste um pequeno móvel onde está o computador, e uma porta de acesso ao cômodo; na parede oeste outra porta; e na parede sul (a mesma da janela) um sofá e uma poltrona, dessas que viram uma espécie de cama. Nesta última está deitado o casal.

O rapaz está deitado com suas costas no encosto da poltrona, e a moça está deitada em seus braços, com a cabeça em seu peito, pouco abaixo de seu pescoço.

- Táta, tá dormindo? – ele pergunta, num sussurro.

- Mmmmm, ainda não. Não quero dormir, quero aproveitar essa noite. – diz ela com a voz pastosa de quem luta contra o próprio sono.

Um filme sobre esses poucos dias que estiveram juntos passa na cabeça do rapaz. Foi tudo tão rápido. Foi tudo tão de repente. Um dia ele simplesmente se deu conta que precisava estar com a moça e, então, estava feito. Essas coisas do coração eu nunca pude entender.

Ele segue acariciando o cabelo da moça, se esforçando para tirar o peso de sua mão e toca-la suavemente. Isso, porém, está cada vez mais difícil porque exige concentração – e ele não pode mais se concentrar. Uma dúvida o deixa inquieto.

“Eu quero falar. Não que eu precise falar, mas eu quero falar. Eu quero que ela saiba, mesmo que essa seja nossa última noite juntos”.

Ao pensar na possibilidade de falar à moça algo que lhe esteve preso na garganta por todo o dia, o rapaz ficou nervoso.

“Estranho. Depois desse tempo todo eu pensei que jamais voltaria a sentir esse nervosismo ao dizer essas palavras para uma mulher” – ele pensa.

A noite está com uma temperatura agradável, na casa dos 25 graus, mas o rapaz sente muito calor. Seus pensamentos lhe renderam uma boa dose de adrenalina, que lhe acelerou o coração e aumentou o ritmo de seu fluxo sanguíneo, elevando sua temperatura corporal.

Ao notar isso ele tenta se acalmar. Ele ajusta sua respiração à da moça, sentindo-lhe o movimento do peito e, por um instante, tem a sensação de que seu coração é uno com o dela.

“E se ela não acreditar em mim? Se ela pensar que estou dizendo isso por ‘querer algo mais’? Se achar que digo isso a todas as mulheres?”

Ao pensar essas coisas, sua respiração e seu coração, descompassados novamente, perdem-se dos da moça. Ao notar que não vai ficar tranqüilo enquanto não falar o que tem a dizer, ele decide falar.

Ele pensa nas palavras, respira fundo, toma ar e...as palavras se perdem em sua boca, enquanto outro pensamento lhe toma a mente:

“E se ela não acreditar em mim? Se achar exagerado tudo isso, afinal nós namoramos há apenas sete dias...Se achar que eu não sei o que é amar?”

Passam alguns segundos e ele se prepara para uma nova tentativa. Ele respira fundo e...as palavras param em sua garganta.

“E se ela não acreditar em mim? E se ela pensar que...”

- Fala – diz a moça, interrompendo os pensamentos do rapaz.

“Como ela sabe que estou tentando falar alguma coisa? O que eu faço agora? O que eu digo?” – pensa.

O coração do rapaz bate agora tão descompassado que parece querer falar, ele mesmo, o que se passa consigo e acabar logo com essa agonia.

“Quer saber? Não importa. Não importa o que ela vai pensar. Importante é sentir-me assim, feliz. Importante é que ela saiba o quanto me faz feliz.

Esse lance de dizer ou não essas palavras é muito supervalorizado e subestimado ao mesmo tempo. As pessoas perdem tempo pensando se o sentimento é ou não real; se é ou não verdadeiro. As pessoas têm medo de estarem equivocadas, de que tudo isso se perca algum tempo depois.

E se esse relacionamento acabar em dois ou três meses, ou em um ou dois anos, isso realmente importa alguma coisa? Não seria melhor, então, que esse tempo fosse vivido de maneira intensa e verdadeira, sem tantos medos e dúvidas?

Superestimar essas palavras escolhendo dia e hora para falar, esperando uma prova que as mereça é subestimar o valor e o poder que essas palavras têm sobre quem as escuta. É subestimar a própria razão de ser desse sentimento.

Existem pais que nunca as falaram a seus filhos e filhos que nunca as falaram a seus pais. Existem irmãos que nunca as falaram uns para os outros. Parentes que nunca as falaram uns para os outros. Amigos que nunca as falaram uns para os outros. Casais que nunca as falaram uns para os outros. E por quê?

Eu não vou perder mais tempo, se tempo é exatamente o que nós não temos nesse momento”.

Dessa vez não há ritual. Ele não precisa se preparar para falar. Agora está, finalmente, tranqüilo. Seguro.

Ele leva sua boca ao ouvido da moça e...fala baixinho:

- Eu te amo.

4 comentários:

  1. Olá Robson! Belo e verdadeiro como o sentimento maior. O momento é sempre o agora. Nunca adiar palavras ou sentimentos.
    E com certeza 'Ela' lá do alto com todo o seu brilho, magia e encanto sorriu e abençou o magico momento.
    Gostei muito e lógico me emocionei.
    Parabéns!

    Bjo

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  2. Achei, seriamente, que você iria pular esse post.

    Acredito que essa será minha última aparição por aqui, né?? =~

    Mas está perfeito... Como foi todo o nosso namoro.

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  3. hola que tal? me encanta tus textos, pero pienso que podrias escreverlos en el castellano tb.
    te felicito!!!!!sos bueno hasta para decir te amo!!!besos.

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  4. Muito emocionante, deu para perceber todo o sentimento envolvido.Parabéns

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