sábado, 8 de janeiro de 2011

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Londres, Inglaterra, primeira semana de janeiro de 2010

Ealing, segundo meu irmão, é um dos bairros mais antigos de Londres. Saber disso me deixa maravilhado. De fato, esse bairro é o próprio estereótipo da arquitetura londrina: ruas estreitas, um monte de casas idênticas, de dois andares, feitas de tijolinho de barro e telhados num ângulo aproximado de 60 graus, todas com um pequeno jardim na frente e só algumas com garagem.

As ruas são estreitas (como em toda a cidade) e talvez por isso poucos carros transitam pelas vias. Tenho a impressão de que o metrô de Londres é tão extenso e desenvolvido por pura falta de opção – é praticamente impossível andar de carro por aqui, em parte por não caber nas ruas e em parte por não haver lugar onde estacionar.

O “flat” onde morava meu irmão era um “pedaço” de uma dessas “casas padrão” – é muito comum os proprietários dividirem essas casas antigas e grandes em pequenos flats para ganhar um pouco mais no valor final do aluguel. Pequenos mas nem tanto, pois esse – por exemplo – tinha dois quartos, banheiro, cozinha e uma área externa nos fundos.

Nós estávamos na cozinha/sala – o mesmo ambiente era dividido dessa forma: de um lado a cozinha, com geladeira, fogão e armários, e do outro a sala, com sofá, televisão e vídeo-games, MUITOS vídeo-games – tentando definir para onde iríamos, que lugar da capital inglesa visitar, quando o meu irmão olhou as horas e nos disse:

- Ó, vocês vão pensando aí no que querem fazer enquanto eu preparo alguma coisa pra Bru comer quando chegar do trabalho...

Foi nesse momento que eu vi com muita clareza um dos motivos – talvez o mais importante deles - do fim do meu casamento.

***

São Paulo (Guarulhos), Brasil, 11 de maio de 2010

Tomar aquela decisão foi uma tentativa de encontrar um novo rumo pra minha vida. Em pouco mais de 6 meses, tudo o que eu tinha planejado, lutado e acreditado nos últimos 4 anos se desfez como um castelo de areia numa tempestade num deserto.

Minha vida profissional se foi com minha escola de música quando eu e minha ex-esposa a fechamos. Eu simplesmente não tinha o que fazer, com o que trabalhar. Eu até poderia arrumar um emprego de qualquer coisa, mas isso implicaria desistir da carreira musical.

Esse fator profissional teria sido facilmente superado, não fosse um “pequeno detalhe”: com o fim da escola de música veio também o fim do meu casamento – e o fim do apoio que a Ná sempre me deu. Fechar a escola não foi fator determinante para o fim do casamento, mas tudo aconteceu ao mesmo tempo. Minha vida mudou da água pro vinho sem emprego e sem esposa.

- Nego, meu irmão me fez um convite... – comecei a conversa com o Nego, naquele dia no Parque do Ibirapuera (São Paulo, SP).

Não era um convite fácil de aceitar. Aceitar esse convite implicava largar a ETEC de Artes e o Conservatório Municipal de Guarulhos. Aceitar esse convite implicava dar o último golpe, aquele de misericórdia, no meu sonho. Aceitar esse convite era perder a última coisa importante da minha vida até então: depois da escola de música, depois da esposa, o sonho.

- Nego, lembra do convite do meu irmão? Eu aceitei. – o Nego não ficou surpreso, quando lhe dei a notícia alguns dias depois, na escola.

- É, eu já esperava... – ele disse.

Trancar meu curso na ETEC de Artes me levou à lona outra vez naquele semestre e, mesmo que não tivesse me dado conta naquele momento, eu não levantaria tão cedo – talvez não levantasse antes da contagem acabar.

O aeroporto de Guarulhos já era um lugar familiar pra mim. Assim mesmo me deixava um tanto desconfortável naquele 11 de maio de 2010. Ferido e com um sentimento de derrota do tamanho do planeta, eu ainda procurava forças para reconfortar minha mãe, meu pai, o Nego e a Dani, que me acompanhavam naquele dia.

Até então nós acreditávamos que eu estava indo para Londres para não voltar mais (ou pelo menos ficar alguns anos por lá). O plano era chegar, trabalhar com o meu irmão e fazer os trâmites para obter um visto de estudante ou de familiar dependente financeiro.

Minha intenção era “crescer”, deixar de lado esse sonho infantil de carreira musical e encarar a vida como se deve: trabalhando para viver e vivendo para trabalhar, como todo mundo. “Crescer” e construir alguma coisa sólida, concreta, que pudesse resistir a qualquer tempestade.

No saguão movimentado, apinhado de gente de todas as caras, cores, credos e idiomas ninguém parecia notar nosso choro – assim como nós não podíamos notar o choro alheio.

- Vai com Deus, filho – disse minha mãe.

- Boa sorte, mané! – falou meu pai.

E assim, eles deram as costas e se foram. Só quando meus pais partiram eu permiti que meu choro se tornasse lágrimas. Essa minha mania de me fazer forte vai me matar um dia.

Ainda faltavam algumas horas para minha partida, então o Nego e a Dani esperaram mais um pouco. A gente ficou conversando aleatoriamente, mas nenhum dos três podia, de fato, prestar atenção na conversa. Volta e meia um dos três deixava transparecer sua emoção pela despedida.

E o momento chegou.

Caminhamos até o portão de embarque.

Eu peguei a fila e, quando passei por eles, lhes dei um último abraço.

Choramos.

Segui adiante.

***

Depois de uma longa viagem – tive que esperar pouco mais de 9 horas em Porto (Portugal) por conta de um vôo perdido na conexão – eu avistei Londres pela janela do avião. Estava linda, desafiando o negrume da noite com aquela porção de pontinhos luminosos.

O avião pareceu adivinhar meu desejo quando arremeteu a aterrissagem. Na segunda tentativa, porém, tocamos o solo. Estava feito. Juntei minhas coisas e me preparei para o desembarque.

3 comentários:

  1. É isso Robson: nossa vida é uma grande viagem com várias estações. Em cada parada, tentativa, sofremos, mas aprendemos. Assim crescemos. Tentar sempre. Desistir nunca. O mais importante: saber que não estamos sozinhos e a 'estação principal' está sempre a nossa espera...para cada recomeço.
    Parabéns!
    Bjo

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  2. Olá Robson acho que nem deve lembra de mim, Mais gostei muito de suas palavras e me coloquei em casa situação que você passo, realmente parece quando algo nao da certo vem tudo de uma vez,mais a vida é assim e apenas me concientizei disso quando alguem que amava muito me deixou. levo sempre uma frase comigo."O sucesso não é o final e o fracasso não é fatal: o que conta é a coragem para seguir em frente" continue assim cara forte mesmo que seja dificil mais um dia tudo se resolve, e você vai percebe que venho a terra para isso superar e aprende a cada dia, Abraços Alisson Lopes.

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  3. É isso ae Robsão não criamos a porra dessa vida, mas tb não somos criação dessa porra de vida, o que conta mesmo é erguer-se, passar mertiolate na ferida e seguir adiante, mesmo porque: parar não vai fazer dessa porra de vida melhor!

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